Nos noticiários sobre as enchentes em Pernambuco e Alagoas, me chama atenção a firmeza e a determinação dessas pessoas, que perderam tudo, mas mantêm a altivez. Quando entrevistadas, dizem o que pensam, sem apelos dramáticos. Sabem que precisam lutar pra reconstruir o pouco que tinham e viram ser levado pelas águas. Me lembram o povo da minha Canudos, que também viu sua história afundar nas águas do Vaza-Barris. Esse povo de aparência frágil é guerreiro e vai reconstruir suas cidades devastadas. Vi relatos impressionantes, como o de um grupo de 50 quilombolas que foram resgatados depois de passar 18 horas em cima de duas jaqueiras. Vi relatos emocionantes, como o de um homem que estava feliz porque conseguiu salvar parte dos livros. Mas em todos, da Palmares do líder Zumbi, à Quebrangulo do escritor Graciliano Ramos, em todos os municípios de Alagoas e de Pernambuco atingidos pelas enchentes, é a solidariedade o que mais me emociona. Quem perdeu menos abriga quem perdeu tudo. Sim, têm os saqueadores, que se aproveitam pra roubar. E os políticos sem caráter, que tentam se aproveitar da situação. Não acho que seja o caso de Lula. Ele sabe que podia estar entre os que estão desabrigados se ainda vivesse lá. Por isso foi aplaudido por onde passou. Aquela gente ainda acredita na boa fé do presidente. Ah! e tem a pior espécie, que é o especulador, os que querem ficar mais ricos se aproveitando da desgraça do outro. Mas eu sou canudense, sertaneja, nordestina e, principalmete, grande torcedora deste Brasil solidário, que vai vencer o brasil dos corruptos, dos ladrões e dos especuladores. Por isso, acho que devemos nos engajar nas campanhas de doações. Pra ajudar, neste momento, a derrotar os que estão vendendo velas, água e comida mais cara. E como diz o poema de Jorge de Lima, um ilustre poeta nascido em União dos Palmares em 1893, com os poderes de Nosso Senhor Jesus Cristo, vai nascer tudo de novo.
Inverno
Jorge de Lima
Zefa, chegou o inverno!
Formigas de asas e tanajuras!
Chegou o inverno!
Lama e mais lama
chuva e mais chuva, Zefa!
Vai nascer tudo, Zefa,
Vai haver verde,
verde do bom,
verde nos galhos,
verde na terra,
verde em ti, Zefa,
que eu quero bem!
Formigas de asas e tanajuras!
O rio cheio,
barrigas cheias,
mulheres cheias, Zefa!
Águas nas locas,
pitus gostosos,
carás, cabojés,
e chuva e mais chuva!
Vai nascer tudo
milho, feijão,
até de novo
teu coração, Zefa!
Formigas de asas e tanajuras!
Chegou o inverno!
Chuva e mais chuva!
Vai casar, tudo,
moça e viúva!
Chegou o inverno
Covas bem fundas
pra enterrar cana:
cana caiana e flor de Cuba!
Terra tão mole
que as enxadas
nelas se afundam
com olho e tudo!
Leite e mais leite
pra requeijões!
Cargas de imbu!
Em junho o milho,
milho e canjica
pra São João!
E tudo isto, Zefa...
E mais gostoso
que tudo isso:
noites de frio,
lá fora o escuro,
lá fora a chuva,
trovão, corisco,
terras caídas,
córgos gemendo,
os caborés gemendo,
os caborés piando, Zefa!
Os cururus cantando, Zefa!
Dentro da nossa
casa de palha:
carne de sol
chia nas brasas,
farinha d'água,
café, cigarro,
cachaça, Zefa...
...rede gemendo...
Tempo gostoso!
Vai nascer tudo!
Lá fora a chuva,
chuva e mais chuva,
trovão, corisco,
terras caídas
e vento e chuva,
chuva e mais chuva!
Mas tudo isso, Zefa,
vamos dizer,
só com os poderes
de Jesus Cristo!
* Amiga que mantém a fé nas pessoas.
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